
Uma nova abordagem em biomedicina: a descoberta do transcriptoma em nível tecidual
A transcriptômica de resolução espacial (SRT) é uma tecnologia que mapeia a expressão gênica dentro de um tecido, atualmente com duas vertentes principais: baseada em imagens e baseada em sequenciamento de nova geração (NGS). Suas aplicações na biomedicina são evidentes, especialmente na caracterização da heterogeneidade tumoral e na identificação de estruturas, ao mesmo tempo em que lança luz e contexto sobre técnicas de sequenciamento como o single-cell-seq.
Como a transcriptômica espacial melhora o scRNA-seq
Embora o scRNA-seq tenha revolucionado a análise da expressão gênica em nível celular, ele apresenta uma limitação significativa: a ausência de informações espaciais ou de contexto tecidual. Durante o sequenciamento, as células, ao serem dissociadas de seu contexto orgânico, perdem informações cruciais sobre localização e interações dentro do tecido. A transcriptômica espacial (SRT) resolve essa limitação, fornecendo dados de expressão gênica de alta eficiência enquanto preserva o contexto espacial do tecido. Essa dimensão adicional oferece vantagens e melhorias significativas em relação ao sequenciamento single-cell.
Ao manter as células em seu contexto tecidual, a SRT permite estudar localização, interações e funções celulares, algo essencial em sistemas complexos como os tumores. As interações celulares cancerígenas e seu microambiente desempenham papéis cruciais no desenvolvimento e progressão tumoral. Além disso, a identificação de padrões específicos de expressão gênica em regiões-alvo, que poderiam ser mascarados no scRNA-seq, contribui para uma melhor compreensão do funcionamento tecidual e tumoral.
A combinação de dados de expressão gênica com informações espaciais pode identificar novos tipos e subtipos celulares que não seriam detectados apenas pelo scRNA-seq. Além disso, a SRT é especialmente valiosa na caracterização detalhada de microambientes tumorais (TME). Ao mapear a distribuição de diferentes tipos celulares, é possível identificar áreas específicas de infiltração imunológica, interações com células estromais e regiões sob condições de hipóxia, contribuindo para o desenvolvimento de terapias oncológicas mais eficazes.
A SRT também pode ser utilizada para validar ensaios scRNA-seq, confirmando espacialmente os tipos celulares e os padrões de expressão. A dimensão adicional oferecida pela SRT agrega informações cruciais, com potencial para revolucionar a compreensão de sistemas biológicos complexos e acelerar o desenvolvimento de novas estratégias de diagnóstico e terapia.
Transcriptômica espacial e a jornada para a integração multiômica
Ambos os métodos de transcriptômica espacial oferecem vantagens e desvantagens únicas na pesquisa do transcriptoma. Os métodos baseados em imagens implicam na visualização direta de moléculas de RNA in situ, geralmente utilizando técnicas de microscopia de fluorescência com alta resolução espacial, até mesmo a nível subcelular, como a hibridização fluorescente in situ (FISH) e o sequenciamento in situ (ISS). Em contrapartida, os métodos baseados em sequenciamento utilizam plataformas NGS para analisar a distribuição espacial da transcrição gênica, incorporando códigos de barras espaciais às bibliotecas de RNA, permitindo observar a transcrição após o sequenciamento.
Os métodos baseados em imagens permitem a localização precisa dos transcritos em nível individual dentro das células com alta resolução, mas apresentam uma cobertura tecidual limitada ao campo de visão das imagens. Por outro lado, a resolução espacial dos métodos baseados em sequenciamento é menor e limitada pelo tamanho dos códigos de barras utilizados, resultando frequentemente em medições multicelulares.
Os métodos baseados em sequenciamento têm maior rendimento, permitindo analisar uma quantidade maior de genes, já que toda a transcrição é detectada e processada de forma massiva e paralela por NGS. Métodos baseados em imagens, por outro lado, são limitados pelo número de canais fluorescentes e ciclos de imagem de análises multiplexadas.
Métodos baseados em sequenciamento são geralmente não direcionados, o que significa que não precisam de listas ou painéis predefinidos de genes para análise. Isso é útil para a descoberta de novos dados do transcriptoma e oferece uma visão abrangente do que está sendo transcrito. Métodos baseados em imagens, no entanto, trabalham frequentemente com listas direcionadas devido às limitações das sondas utilizadas nas bibliotecas. Apesar disso, o FISSEQ permite análises não direcionadas da distribuição do transcriptoma.
Ambos os métodos apresentam complexidade no processamento de dados. Métodos baseados em imagens exigem análises computacionais desafiadoras, especialmente em experimentos com grandes volumes de dados. Métodos baseados em sequenciamento também requerem ferramentas bioinformáticas especializadas, mas, em geral, oferecem maior facilidade no processamento.
Recentemente, a compatibilidade de amostras foi aprimorada, e ambas as metodologias são aplicáveis a diversos tipos de tecidos, incluindo tecidos frescos, congelados e FFPE (fixados em formalina e incluídos em parafina). Essa flexibilidade é crucial para aplicações clínicas e análises de amostras armazenadas.
Ambas as metodologias também foram adaptadas para análises tridimensionais (3D), embora ainda enfrentem desafios relacionados às técnicas de clareamento e expansão tecidual, além das altas demandas computacionais para processar grandes volumes de dados 3D.
Em resumo, os desenvolvimentos futuros buscam superar essas limitações e ampliar as virtudes da transcriptômica espacial. A integração multiômica aparece como destaque, oferecendo uma compreensão multidimensional dos sistemas biológicos. Essa abordagem tem um enorme potencial em diversas áreas da biomedicina, incluindo a pesquisa oncológica e o estudo de sistemas biológicos complexos, como os neurocientíficos, consolidando-se gradualmente como uma ferramenta revolucionária no desenvolvimento de estratégias diagnósticas e terapêuticas.